Políticas públicas e a luta que não pode esperar: o crime de agressão a uma jovem em Natal-RN nos alerta para a emergência no combate à violência contra as mulheres

DIREITOS DAS MULHERES

Eunice Torres Nascimento

8/4/20252 min read

No brutal episódio registrado em Natal neste último final de semana — em que um homem foi preso após desferir mais de 60 socos no rosto da própria namorada — vemos, de forma crua, a face da violência de gênero que ainda permeia nosso país. É esse retrato extremo, mas infelizmente longe de ser isolado, que serve de ilustração para a urgência das novas políticas de prevenção e enfrentamento à violência contra as mulheres anunciadas pelo MJSP e pelo Ministério das Mulheres em março do ano corrente.

A cada hora, quatro mulheres são agredidas no Brasil, e o feminicídio segue como chaga social. O caso de Natal, em que a jovem quase teve sua vida ceifada por quem dizia amá‑la, nos lembra que não estamos lidando com episódios pontuais, mas com uma cultura enraizada de dominação patriarcal. É essa herança de séculos de desigualdade que legitima comportamentos como o do agressor — e que as políticas públicas precisam enfrentar com seriedade.

O anúncio de “integração de ações” entre delegacias, serviços de saúde e redes de apoio é um passo imprescindível. No entanto, não basta prometer articulação: é preciso garantir que, quando uma mulher decide denunciar, haja acolhimento imediato, canal seguro de comunicação e abrigo protetor. Sem infraestrutura nas pequenas cidades do interior e sem capacitação permanente de policiais, assistentes sociais e psicólogos, o discurso corre o risco de se perder em burocracia.

A prevenção, outro pilar anunciado pelo governo, só será eficaz se levarmos a luta para dentro das escolas e das comunidades. Meninas e meninos precisam aprender, desde cedo, que respeito e igualdade não são meras palavras em um cartaz: são práticas diárias. Tomando ainda como exemplo a agressão hedionda ocorrida em Natal contra a jovem, faço um questionamento: se ela tivesse crescido em uma sociedade onde o machismo fosse questionado, onde o “briga de marido e mulher não se mete a colher” não fosse naturalizado, será que o ciclo de violência teria chegado a um estágio tão brutal?

No entanto, não podemos esquecer que prevenir não significa proteger sem ouvir! As políticas de enfrentamento devem ser construídas em diálogo com as próprias vítimas e com os movimentos de mulheres que atuam no território — são elas que conhecem as lacunas do sistema e os melhores caminhos para superá‑las. A jovem agredida, como tantas outras, precisa de autonomia para decidir seu percurso de acolhimento, de justiça e de reconstrução.

Por fim, a contínua repetição de casos de agressão contra as mulheres nos ensina que políticas públicas são ferramentas, não milagres. Sem verbas garantidas, fiscalização rigorosa e, acima de tudo, pressão social constante, elas correm o risco de ficar na teoria. Se queremos um Brasil onde nenhum rosto feminino seja alvo de tamanha barbárie, é nossa tarefa coletiva exigir que esse anúncio não se limite a manchetes, mas se traduza em vidas salvas, em vozes ouvidas, em futuros protegidos. Só assim, inspirados pela coragem das sobreviventes e honrando a memória e existência daquelas que não tiveram a mesma sorte, poderemos transformar essa realidade que nos envergonha.